terça-feira, 24 de janeiro de 2012

Pedinte de Belém


“Irei receber 1300 euros por mês. Quase de certeza que não vai chegar para pagar as minhas despesas porque como sabe eu não recebo vencimento como Presidente da República”.
A iniciar o segundo ano do segundo mandato presidencial, Cavaco Silva quis também ele dizer aos portugueses que acompanha a dura realidade que o País atravessa e que também ele vai ser afectado com os cortes impostos pela grave conjuntura.
Levantaram-se logo vozes críticas dos vários quadrantes políticos, criou-se uma petição on-line com o objectivo de demitir o presidente, ouviram-se apupos em eventos, fizeram-se manchetes, abriram-se jornais com vozes indignadas de protesto contra estas declarações, colocou-se o carácter e a função do Chefe de Estado em causa, criam-se ‘vaquinhas’/movimentos de ajuda ao Presidente e tenho a certeza que se formos perguntar a uma senhora idosa o que acha desta polémica toda ela ainda diz que se tivesse tido mais dinheiro há uns meses para curar um problema num braço, o que lhe daria agora alguma força, lhe dava com a bengala nos calcanhares.
Não percebo porquê tanto alarido, tanta onda de contestação, tanta revolta nas palavras de um lado e de outro, tanta indignação.
As pessoas não têm noção das despesas que um Presidente de República pode ter porque se tivessesm estavam era bem caladinhas. E eu já nem falo dos quase 40 anos de descontos como professor universitário ou como investigador na Fundação Calouste Gulbenkian, nem da lista de funções que nunca mais acaba que o senhor tem de cumprir. Falo pois dos 1300 euros que representam parcos rendimentos para quem tem uma casa de férias na praia da Coelha para manter, que tem de vestir fatos à altura, com corte perfeito e tom a condizer com a pele, onde não servem fatos do Continente, cheios de linhas e com defeitos aqui ou ali, o corte de cabelo sempre bem alinhado à esquerda, os presentes para a carrada de filhos e netos, multiplicados por aniversários, natais, páscoas, Dia do Bolinho (e à enorme quantidade de crianças que vai bater à porta dele nesse dia) e claro não podia deixar de ser as flores que compra com frequência para a esposa a agradecer por há tantos anos lhe passar as camisas.
Por isso meus caros senhores, principalmente àqueles que falaram sem pensar dois segundos antes, é claro que um ordenado de 1300 euros não chega a todo o lado.

sábado, 15 de outubro de 2011

Isto vai ficar feio, mas só para alguns


A notícia do médico que recebeu 796 mil euros em 2008 e 744 mil euros em 2009 não passou despercebida nos jornais de hoje, dois dias depois de o primeiro-ministro, Pedro Passos Coelho, naquele momento nefasto de emergência nacional, ter falado ao País. O caso é revelado pelo Tribunal de Contas na sequência de uma auditoria feita aos salários dos gestores dos hospitais EPE. Contas feitas, cerca de 60 mil euros por mês. É impossível ficar num estado de neutralidade e apatia perante tal revelação, e o que mais assusta é que há mais casos semelhantes do que qualquer um de nós pode imaginar. Num dia em que saem à rua milhares de protestantes por todo o mundo fazendo ouvir as suas vozes contra o fosso cada vez maior que há entre ricos e pobres, uma notícia destas choca-nos assim como nos choca saber que em PORTUGAL, quem sabe se não mesmo o nosso vizinho, passa os dias a comer sopa  numa panela com pouco mais do que 2/3 batatas,  uma cenoura e meia cebola e o resto é água, a criança que tem apenas uma refeição por dia ou o velho que anda com os mesmos sapatos rotos de Verão e de Inverno há anos. E perguntamos nós onde está a justiça, onde está o bom-senso? Agora vai ser pior ainda, mas só para alguns.

quinta-feira, 13 de outubro de 2011

Troika corta chico-espertismo


António era um homem trabalhador. Nunca tivera férias na vida. Os seus dias eram passados a lavrar a terra, único sustento da família. Mesmo doente, em dias de chuva intensa, ou de sol abrasador tinha de se levantar bem cedo e pôr mãos à obra. As dores nas costas e nas pernas, as mãos gretadas e ásperas e os cabelos brancos eram sinais visíveis de uma vida de trabalho intenso, duro e de muitas dificuldades. Manuel, seu vizinho, era de uma condição diferente. Toda a vida conseguiu as coisas de forma fácil, sem trabalho, sem esforço. E sempre que queria uma e outra coisa, conseguia-a. Mesmo que isso implicasse passar por cima de quem quer que fosse.
Ora vem isto a propósito de uma estória que ouvi na rádio.
Um maratonista britânico venceu a medalha de bronze depois de ter feito...batota. Cansado, ou simplesmente armado em chico-esperto, não teve pudor em apanhar um autocarro quando faltavam 10 quilómetros para cortar a meta. Depois, foi fácil. Já perto do final da prova em Kielder, desceu do autocarro, escondeu-se atrás de uma árvore e, discretamente, juntou-se ao pelotão. Depois de uma investigação, Rob Sloan acabou por confessar a proeza, no entanto, o terceiro lugar no pódio ficou garantido. Mas esta parte, pelos vistos, não foi impedimento de desclassificação ou de reprimenda.
Isto fez-me lembrar de quantos Antónios há por esse mundo fora e de quantos Manuéis e Sloanes lhes passam à frente, mesmo que injustamente, sem carácter e com a maior pouca-vergonha.
A vida tem destas coisas.

terça-feira, 4 de outubro de 2011

 Acabadinho de ler: Rio das Flores, MST

Próximo: Snu e a vida privada com Sá Carneiro, CP

terça-feira, 2 de agosto de 2011

O tempo que doamos aos outros é recompensado em dobro. Brevemente.


Estou a desenvolver um trabalho sobre o Dia Internacional da Solidariedade.
Se és uma pessoa que gosta de ajudar nos tempos livres com trabalho voluntário ou se conheces alguém que dedique tempo das suas vidas aos outros, entra em contacto comigo.
 Obrigada,
 Sílvia Morgado
scgmorgado@gmail.com

quarta-feira, 27 de julho de 2011

Manobras perigosas para um minuto de fama


Segundo o dicionário da Língua Portuguesa tourear significa correr/lidar touros no circo ou numa praça. Vem isto a propósito do último fenómeno que tem aparecido em jornais, televisões e plataformas digitais e que já levou à morte de um adolescente, ou melhor, do António, com 17 anos.
Esta ‘brincadeira’, que consiste em esperar que um carro se aproxime e correr de uma berma da estrada até à outra, obrigando os condutores a travar abruptamente ou a fazer manobras perigosas, dá-se pelo nome de ‘tourear carros’. Eu chamo-lhe estupidez!
Esta ‘brincadeira’, em que um grupo de amigos enche a peitaça e mostra os seus dotes de coragem, de atrevimento e valentia, pretendia ser posta na internet. E de repente isto faz-me lembrar qualquer coisa. Ai pois é: o fenómeno Hélio. E pergunto-me até que ponto não somos responsáveis (nós e a comunicação social) pela morte do António. A importância desmedida que se deu a um simples vídeo, com um número recorde de visualizações, levou a que aquele grupo de jovens quisesse também ele ser um herói, nem que fosse apenas por alguns dias. Se a coisa tivesse corrido bem, talvez aparecessem na televisão, fossem entrevistadas as famílias, até quem sabe iam a algum programa de TV para contar tal façanha. Mas não foi isso que aconteceu. Alguém já se lembrou de perguntar ao Hélio se ele tem noção de que a estupidez dele e de quem pôs o vídeo na net podem ter influenciado muitos jovens por esse país fora? O medo a ele não o assiste. Para António, o medo não o assistiu, nem mesmo os amigos, que assim que se viram enrascados com o atropelamento brutal, deram à sola. Aí nesse momento a valentia de ser melhor do que o do lado assolou-se de medo e de cobardia.
Hoje em dia já não se toureiam apenas animais. A estupidez vai bem mais longe.
Os limites do bom senso parecem cada vez mais água ao sol em dia de muito calor: evapora-se.